segunda-feira, 29 de março de 2010

Revista Idéias e texto de Claudia Wasilevski

Circulando a Revista Idéias sob o comando de Fábio Campana.
Entre os escritos está um inédito de Claudia Wasilewski intitulado Supermercado. Vale ler.
A capa da revista traz uma espetacular montagem e diz: Não há mal que sempre dure




Supermercado
por Claudia Wasilewski

Está acontecendo um fenômeno, inexplicável. As pessoas quando ultrapassam a placa de entrada do estacionamento do supermercado, se transformam. Dali em diante tem consciência que estão no front, prontas para a guerra. No estacionamento começa o horror. Pedestres e motoristas não se entendem. Avançam uns sobre os outros com se fossem inimigos. Carrinhos vazios deixados propositalmente atrás dos carros, é o simbolismo de uma espécie de vingança, de desaforo.
Agora, dentro dele, os carrinhos não desengatam. Aí se revelam as diferentes personalidades dos seres humanos. Os calmos tentam com leveza, movimentá-los até se desconectarem. Os nervosos os balançam, dão porradas, chutam até que se soltem. Os insanos como eu, além de chutes e porradas, fazem um discurso, como os funcionários de lá são explorados e descontam todos os seus problemas, naqueles malditos carrinhos. Usando a força, começa aquele barulho de metal. Chama a atenção, mas não faz mal, o carrinho é meio de transporte mais popular do consumo.
Finalmente junto às gôndolas, todos se empurram, se fecham e vira um trânsito infernal, onde não existem regras.
As comadres se encontram e transformam o corredor em sala. Fofoca, conversa, e quando chegam no assunto de doença vira um jogo de truco. Uma sente dores, a outra tem uma doença sem diagnóstico. Levanta para 12 e diz que sente o cérebro amortecer. Em volta já se tem uma sensação de slow. Tudo lento para se conhecer os detalhes daquele causo.
Enquanto as mães se visitam as crianças dominam o espaço. Correm, gritam, esmagam biscoitos, estouram iogurtes. Mas as mamães continuam firmes, entre chás e remédios.
Quando se pensa que nada mais pode piorar, chega um homem. Deveria ser criado um horário especial para eles. Proponho entre as 02:00 e as 05:00 da madrugada. Eles pensam que corredor de supermercado tem mão única. Trafegam exatamente pelo meio. Pensam que são o Moisés com o cajado. Por onde passam, abrem, dividem. E passam com ar superior, bem pelo meio. Acreditam que existe uma regra. Deve-se colocar um produto de cada vez na esteira. Ficar olhando, a caminhada dele até chegar na mão da moça do caixa.
Rumo ao caixa, se vê uma corrida maluca. Todos têm que tirar o máximo de proveito. Pressa, desespero. Mas que fique claro, só a caminho do caixa. Talvez a conversa de cerca das comadres tenha atrasado a vida delas.
Não esqueça, antes de sair de casa olhe fixamente para o espelho e repita, pelo menos trinta vezes: -EU ME ODEIO!
Ou entre em um site de compras e seja feliz. 

Um comentário:

  1. Querido Luiz arthur

    Estou adorando seu blog! maravilhoso!
    bjs da amiga,
    Marília Pacheco

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